1.4. Morte e filosofia
Assim como os artistas, os filósofos pensam muito sobre a morte e buscam responder a indagação formulada no começo do presente trabalho (É a morte o fim de tudo?). Não fogem da questão, como o fazem os cientistas.
Segundo
Will Durant, isso acontece porque a filosofia aceita
“... a árdua e aventurosa tarefa
de debater problemas não abertos aos métodos científicos – problemas como o do
bem e do mal, da beleza e da fealdade, da ordem e da liberdade, da vida e da
morte; logo que um campo de investigações ministra conhecimentos susceptíveis
de formulação exata, passa a chamar-se ciência. Toda ciência começa como
filosofia e termina como arte; surge como hipótese e remata em realização. A
filosofia é uma interpretação hipotética do desconhecido (como na metafísica)
ou do imperfeitamente conhecido (como na ética ou na filosofia política); é a
trincheira da vanguarda no cerco à verdade. A ciência é o terreno conquistado;
e atrás ficam aquelas seguras regiões onde o conhecimento e a arte constroem
nosso mundo imperfeito e maravilhoso. A filosofia parece imobilizar-se
perplexa; mas isso acontece apenas porque abandona os frutos da vitória às
ciências, suas irmãs, e prossegue o caminho, divinamente insaciável, para o
incerto e inexplorado.” [1]
No plano da filosofia, ocupo-me do pensamento de um sábio grego da Antiguidade que abordou o assunto. Refiro-me a Sócrates, que viveu ente os anos 470 a 399 antes de Cristo.
São interessantes as meditações do ateniense sobre o assunto. Platão relata que ele contestou a acusação de ter corrompido a juventude. Em sua defesa, disse que nunca corrompeu qualquer pessoa, pois se limitou a instruir jovens e adultos, para que não se preocupassem com o corpo e as riquezas, mas cuidassem da alma, para torná-la a melhor possível. Fizera as preleções para educar seus concidadãos. Sabia que os bens públicos ou privados chegam aos homens através da virtude. Por isso, todos os homens somente deveriam se preocupar em fazer o bem.
Ao examinar a “Apologia de Sócrates”, vejo que ele não empregou artifícios para livrar-se da pena capital. Se houvesse se comprometido a abandonar as atividades recriminadas por seus acusadores, talvez tivesse escapado da punição mais severa. Preferiu a sinceridade, porque cultivava a virtude e sabia que a verdade liberta.
Sócrates se defendeu sem mentir. Confessou que prosseguiria cumprindo o dever de filosofar em conformidade com a justiça e outras virtudes. Não hesitou diante da possibilidade de ser condenado à morte. Na sua compreensão, ao cumprir qualquer tarefa, o ser humano enfrenta perigos e “deve avaliar apenas se está procedendo de maneira justa ou injusta, se está agindo como homem virtuoso ou desonesto”, para evitar quaisquer torpezas. [2]
O esforço socrático para se aproximar da verdade sobre os objetos e a respeito do sujeito (autoconhecimento) se desenvolveu através da maiêutica, um método de eliminação das falsas opiniões multiplicando perguntas.
Para Navarro, Sócrates interpretava sua missão sapiencial “como serviço de Deus e cuidado da alma. A filosofia era, para ele, o caminho da purificação”, a vereda que precisava percorrer sem temor para conquistar a liberdade, “ainda que a custo da própria vida.” [3]
O filósofo ateniense findou condenado à pena capital, mas não se intimidou com a reprimenda porque supunha que a morte talvez fosse “o maior de todos os bens para o homem”. [4]
Na visão socrática, a morte seria um bem se acarretasse o fim de tudo, pois corresponderia a um sono sem consciência, e qualquer pessoa gostaria de dormir sem sonhar.
Todavia, se não fosse o fim de tudo, ainda representaria para ele, um homem virtuoso, o maior dos bens, porquanto corresponderia a uma migração da alma de um lugar para outro. Nesta segunda hipótese, seria bem agradável ultrapassar os umbrais da vida espiritual e passar a conviver com outras almas sábias e de boas qualidades. [5]
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Referências bibliográficas:
[1] DURANT, Will. HISTÓRIA DA FILOSOFIA. Tradução de Godofredo Rangel e Monteiro Lobato. Prefácio, revisão, notas, glossário e textos escolhidos por Joel Serrão. 7 Coleção Vida e Cultura. São Paulo/SP: Edição “Livros do Brasil” Lisboa, autorizada pela Companhia Editora Nacional. P. 12.
[2] PLATÃO. APOLOGIA DE SÓCRATES. Tradução de Jean Melville. São Paulo/SP: Editora Martin Claret. 2002. Págs.41/85 (p. 57).
[3] NAVARRO, Eduardo de Almeida. SÓCRATES, O MESTRE DA GRÉCIA E DO MUNDO. Texto publicado no livro de Platão, já citado na nota anterior.
[3] PLATÃO. Obra citada. Págs. 76 e 77 (págs. 41/85).
[4] PLATAO. Obra e páginas citadas no item anterior.
[5] PLATÃO. Obra e páginas citadas no item anterior.
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