O debate de sábado (21), na TV Correio, começou no formato tradicional, de pergunta, resposta, réplica e tréplica com tempos bem delimitados e adotou um modelo alternativo nos blocos seguintes, que consistiu em conceder dez minutos para cada candidato realizar sua respectiva fala, com liberdade de assunto e de uso de tal tempo disponível. Isso pareceu ser uma inovação não muito agradável, tendo em vista que gerou falas demoradas de um mesmo candidato, e isso cansa o telespectador, por conta de ele ter que visualizar a imagem de uma mesma pessoa falando ininterruptamente por período excessivo, inclusive sobre assuntos desinteressantes e pouco emocionantes. Os embates iniciais foram mais dinâmicos, pois as falas alternadas geram mais emoção e fazem com que os confrontos sejam mais acirrados.
Nilvan Ferreira (MDB) começou bem, com uma indagação firme sobre um dos assuntos bastante incômodos para Cícero Lucena (Progressistas), a sua pensão vitalícia de cerca de R$ 23 mil mensais por ter sido governador por apenas oito meses. Tal tema, apesar de não ter tanto impacto eleitoral, é sofrido de ser tratado pelo ex-governador em um confronto ao vivo, já que, além de ter usufruído da regalia, não votou pela sua exclusão quando teve oportunidade, já como senador. O que parecia ser o início de uma dura sequência de embates para Cícero tornou-se, no entanto, um contexto amplamente favorável a ele pouco depois. Nilvan fez uso de uma tática pouco proveitosa: tentou usar a narrativa momentânea da grande mídia nacional sobre o racismo, que o banaliza de forma lamentável, para insinuar que seu oponente o cometera para com ele ao usar a expressão "salto no escuro" em seu guia eleitoral quando se refere à possibilidade de Nilvan vencer a eleição. Cícero não poderia escolher melhor provocação contra ele próprio. Zombou da narrativa de Nilvan e aproveitou para reforçar um de seus mantras de campanha: o de que seu adversário usa sua experiência como comunicador e habilidade de oratória para tentar falsear os fatos, algo que provavelmente explica parte do insucesso, até o momento, do radialista e apresentador na busca pelo voto do eleitor de classe média, mais melindroso.
O debate passou a estar mais equilibrado quando Nilvan fez uso excessivo de truques retóricos e Cícero soube apontá-los bem e contra-atacá-lo com suas máximas publicitárias. Vale ressaltar inclusive o figurino deste último, bastante refinado para a ocasião, na clara ânsia de passar a imagem de gestor experiente, sobretudo à decisiva classe média, enquanto acusa mais e mais o seu oponente de ser um risco desnecessário à cidade. Nilvan, no entanto, ainda conseguiu se recuperar e retomar a dianteira na postura mais crítica e menos defensiva. Ele explorou também a questão do lockdown, mais um claro ponto fraco de Cícero, deixando seu adversário errático e inseguro na resposta, já que seu vínculo a aliados e equipes técnicas que advogam pelo fechamento do comércio para conter a propagação do Covid-19 é público e notório. E ao criticar as inúmeras alianças de Cícero com grupos políticos mais mal vistos pelos eleitores, Nilvan conseguiu neutralizar de forma bastante eficaz o pretenso contra-ataque do candidato do Progressistas, que usou o vínculo de Nilvan com Cássio Cunha Lima (PSDB) e José Maranhão (MDB), políticos com os quais o próprio Cícero foi acostumado a dialogar amistosamente e inclusive a se beneficiar politicamente, para tentar equiparar o teor das coalizões em disputa. Isso foi prontamente rebatido pelo candidato do MDB, que lembrou que a carreira política de Cícero começou com Ronaldo Cunha Lima, pai de Cássio, fazendo-o até ter direito à generosa pensão citada no início do debate, e que, na pré-campanha, teria pedido a Maranhão para Nilvan ser seu vice.
Ademais, gargalos da gestão de Cícero foram novamente explorados, obrigando-o a dar explicações frias e pretensamente técnicas, que provavelmente são malsucedidas em desfazer o impactante efeito publicitário negativo incutido em moradias sem porta e sem reboco, por exemplo. Há muito mais espaço para novidades no arcabouço argumentativo de Nilvan contra seu oponente do que deste para com o primeiro, pois Cícero possui um extenso histórico como político a ser explorado, enquanto seu adversário, não, mas este parece estar receoso em abordar outras questões que poderiam ser aproveitadas, como, por exemplo, posicionamentos e propostas do plano de governo de Cícero frontalmente opostas à ideologia da maioria dos pessoenses. A principal novidade que Nilvan levou ao debate foi um fiasco que quase pôs toda a sua participação a perder no evento. Uma maior guinada ao campo da polarização ideológica, em detrimento da confrontação entre as semelhantes visões administrativas de ambos, pode ser uma ajuda adicional para Nilvan na busca pelo cobiçado voto da classe média, já que até Cícero parece ter vergonha de defender seu programa na parte mais voltada aos seus pressupostos ideológicos e ideias que deles derivam.
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