Davi Alcolumbre e sua procrastinação: um atentado contra a separação dos poderes

Davi Alcolumbre e sua procrastinação: um atentado contra a separação dos poderes


Não é segredo pra ninguém que, por vezes – pra não dizer na maioria das vezes –, os políticos brasileiros agem motivados por interesses nada republicanos. Mas há algo acontecendo em Brasília, nos últimos meses, que já extrapolou os limites do razoável. 

Ocorre que, cumprindo a promessa de campanha de nomear o primeiro ministro do Supremo Tribunal Federal “terrivelmente evangélico”, o presidente Jair Bolsonaro oficializou no dia 13 de julho de 2021, por meio do Diário Oficial da União, ou seja, há quase 70 dias, a indicação do ex-advogado-geral da união e ex-ministro da Justiça e da Segurança Pública André Mendonça à Suprema Corte brasileira. 

COMO DEVERIA SER 

O curso natural desse processo seria, de maneira célere e objetiva, uma vez que o nome do jurista foi sido indicado pelo presidente da república: 1º) haver uma sabatina com ele no âmbito da CCJ – Comissão de Constituição do Senado Federal; 2º) posterior aprovação do candidato por maioria absoluta do Senado Federal; 3°) por fim, após a aprovação pelo Senado Federal, o presidente publicar um decreto no Diário Oficial da União nomeando o ministro para ocupar o cargo, do qual deverá tomar posse no prazo de até 30 dias. 

Entretanto, para que haja a famigerada sabatina deve haver a marcação da data do evento por meio do presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, cadeira atualmente ocupada pelo senador Davi Alcolumbre. 

Porém, o referido parlamentar, que é ex-presidente do Senado, tem se negado, sistematicamente, numa atitude nada democrática, a realizar a sabatina com o Dr. André Mendonça, procrastinando ad aeternum um ato que deveria ocorrer naturalmente sem maiores imbróglios.

AS BIRRAS POLITIQUEIRAS DE ALCOLUMBRE

Muitos jornalistas comentam que, desde que saiu da presidência do Senado, Alcolumbre tem reclamado por mais “prestígio” (ou seria privilégios?) junto ao governo federal e não tem obtido sucesso. Sendo assim, essa procrastinação deliberada seria uma forma de pressionar o presidente para atender aos seus pleitos ou até mesmo uma tentativa de mudar o indicado de Bolsonaro para a vaga no STF. 

O que vemos, no entanto, é que o princípio republicano, que deveria nortear a atuação dos políticos e das instituições para que estes possam cumprir o compromisso de conduzir as ações do Estado de acordo com os interesses do povo, está sendo totalmente ultrajado com esse atraso protagonizado por Alcolumbre, pois certamente não é do interesse de ninguém que uma instituição da envergadura do STF fique sem uma cadeira graças às birras políticas deste parlamentar ou de quem quer que seja. 

INTOLERÂNCIA RELIGIOSA? 

Outros, no entanto, dizem que se trata de uma aversão à religião professada pelo ministro André Mendonça, abertamente evangélico/protestante, que é inclusive pastor da Igreja Presbiteriana. Davi Alcolumbre se diz o primeiro judeu a ter ocupado a presidência do Senado. Logo, seria uma espécie de intolerância religiosa de um judeu para com um evangélico. 

Acerca desse segundo ponto, isto é, a religião do indicado à vaga de ministro do STF, é importante ressaltar que, nos termos do Art. 5º, VIII, da nossa Constituição Federal: “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política...”. 

Portanto, se essa verdadeiramente for a razão para procrastinação da sabatina, tal ato viola flagrantemente a Constituição e o direito à liberdade religiosa do indicado ao STF, haja vista que a sua religião não pode ser obstáculo para ele ser privado do direito subjetivo de, uma vez indicado pelo presidente, ser submetido à sabatina dos membros da CCJ do Senado. 

ATENTANDO CONTRA A SEPARAÇÃO DE PODERES 

A protelação de Alcolumbre também afronta a Separação de Poderes, já que a indicação a ministro do STF é uma competência do presidente da república. Neste sentido, a Constituição é clara:

Art. 101. O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada.

Parágrafo único. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal. (grifo nosso)

Portanto, quando retarda injustificadamente a sabatina, o Presidente da CCJ, de certa forma, está tentando usurpar uma função do presidente (Poder Executivo) e dos seus próprios colegas do Senado (Poder Legislativo), afinal Bolsonaro detém o poder de nomear os ministros da Suprema Corte, mas somente após a aprovação da maioria absoluta do Senado. Com efeito, o comportamento de Alcolumbre além de ser antidemocrático causa instabilidade dentro e entre os poderes da república. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS 

O povo brasileiro já está cansado dessa politicagem nas mais altas esferas do poder que em nada beneficia o interesse público. Neste sentido, diversos líderes e organizações – religiosas e seculares – já se posicionaram manifestando repúdio à atitude do Procrastinador Geral da República e cobrando a marcação da data para a sabatina. 

Até mesmo os próprios membros da CCJ, ou seja, senadores colegas de Alcolumbre, já impetraram um Mandando de Segurança junto ao STF para obrigá-lo a marcar a data da sabatina de André Mendonça. 

Portanto, ninguém aguenta mais essa demora que causa instabilidade no país e sobrecarrega mais ainda o Supremo Tribunal Federal, que no momento conta com um ministro a menos tendo tantas causas a julgar. 

Por fim, gostaria de deixar outra coisa para reflexão... 

Além de Alcolumbre, a quem interessa uma cadeira vazia nesse momento no STF?

O colega professor e advogado constitucionalista Pedro Lenza fez uma análise interessante no seu instagram:

“A não realização da Sabatina, como já disse, viola a Constituição, viola a separação de poderes e, o mais grave, permite que em caso de empate, situações sensíveis sejam resolvidas a favor do réu no caso da 2ª Turma!

A 2ª Turma é responsável pelo julgamento dos casos da Lava Jato! E, como disse, por estar com número par, em caso de empate, haverá favorecimento do réu.”

Fazendo um trocadilho com a célebre frase de William Shakspeare em Hamlet, "Há mais coisas entre A CCJ DO SENADO e O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL do que sonha nossa vã filosofia". 

Aguardemos os próximos capítulos dessa peça!


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